28 agosto 2017

A Marmelada do Costa

O obituário do DM (Diário do Minho) de ontem, participava o falecimento de José Pereira da Costa, um provecto cidadão que se finou aos 94 anos de idade.
Para a maioria das pessoas este nome nada diz, apesar de poderem existir muitas delas com nome idêntico. Para mim, que não sendo amigo, nem vizinho e muito menos familiar do defunto, a comunicação do desenlace trouxe-me à memória momentos de quando era eu um mero catraio e frequentava com assiduidade a loja que uma tia minha mantinha na rua dos Chãos. Isto nos idos anos 60 e 70 do passado século.
A minha presença na dita loja transformava-me num moço de recados que a minha tal tia aproveitava para lhe resolver faltas circunstanciais, a troco dalguns tostões sempre bem recebidos, e na minha pobre opinião, justamente merecidos.
Os encargos que me couberam tornaram-me num exímio conhecedor da rua e de todas as casas que nela tinham porta aberta, bem como das pessoas que as serviam e se postavam à frente dos seus balcões. De todas elas, gostava especialmente de ir à mercearia, porque o senhor Costa, ao contrário da fama de outros comerciantes, dispensava-me o trato educado e prestável que dispensava aos já crescidos.
Os anos passaram e naturalmente todo aquele cenário mudou. A mercearia entretanto fechou.

Desde aí e a cada passo, cruzava-me na rua com o senhor Costa, sempre mais velho e cada vez mais trôpego, mas sempre com aquele ar de pessoa de bem, que julgo que era. Associado à sua pessoa, recordo eternamente o cartaz que tinha na montra do estabelecimento e que me martelava o intelecto: “Toda a gente gosta da marmelada do Costa”.

05 agosto 2017

O Farol de Montedor

Montedor é um lugar da freguesia de Carreço, no distrito e concelho de Viana do Castelo, banhado pelas águas frias do Atlântico.
Sobranceiro ao mar e no seu ponto mais elevado foi construído um farol, que passados mais de cem anos ainda cumpre a função para que foi criado.
O Farol de Montedor, assim se designa, que rivaliza com os classificados Moinhos de Vento pela primazia na procura turística, foi por mim visitado hoje, de forma inesperada, porque, no trajeto que fazia até Caminha, me ocorreu fazer um desvio quando vi a sinalética que o anunciava a quem passava. Conduzi o carro através da povoação e serpenteando por estreitas mas bem tratadas ruelas cheguei ao cume onde está implantado. Não foi a primeira vez que o visitei, mas uma outra vez, já lá vão muitos anos, não lhe dei o devido apreço.
Cheguei ao mesmo tempo que um grupo excursionista espanhol e aproveitei a visita guiada que lhes estava destinada, e fiquei a saber coisas interessantes sobre aquele ou aqueles pináculos cuja principal função é o de auxiliar a navegação através de sinais luminosos.
Entrou em funções em 1910, ano da implantação da república, e foi construído numa estrutura granítica, que se mantém inalterada, que aloja no seu interior uma impressionante escadaria em forma de caracol, também ela em pedra dura da região, constituída por cento e quinze degraus que antecedem uma outra escada em ferro, que por sua vez dá acesso ao topo. Nesse topo está instalado o equipamento que permite o pretendido aviso às embarcações, e esse sim, tem sido modificado tendo em conta a sua otimização e a evolução da técnica.
Dos rudimentares pavios às luminárias a petróleo e destas às atuais lâmpadas incandescentes, foram diversos os meios que garantiram a orientação e asseguraram a navegação dos barcos ao longo dos tempos.
Montedor é o farol mais setentrional de Portugal e a sua localização obedeceu aos critérios estratégicos definidos por entidade supranacional. Mais a norte tem por vizinho um farol localizado já em terras de Espanha, enquanto a sul, o mais próximo situa-se em Esposende. Os sinais luminosos emitidos, que têm um alcance de vinte e duas milhas, terão de ser visíveis obrigatoriamente pelos dois faróis vizinhos, de modo a garantir a eficácia e a normalidade do sistema.
Os sinais luminosos avisadores, são diferentes em cada um dos faróis, permitindo à navegação obter uma rigorosa localização. Primitivamente esses sinais eram acompanhados de avisos sonoros, mas a pouca eficácia demonstrada e a indução a enganos que causava, motivados sobretudo pela inconstante direção e intensidade dos ventos, levou ao seu abandono.
O seu acionamento diário, efetuado outrora pela intervenção do faroleiro, é hoje automático, exercido pela ação da luz, ou pela ausência desta, em células fotoelétricas instaladas.
Neste momento, a manutenção deste e de todos os faróis portugueses está entregue à Marinha, que para o efeito tem elementos seus destacados em serviço permanente, iludindo a antiga imagem do faroleiro que normalmente exercia as suas funções em total isolamento, rodeado pela família. Numa pequena mas elucidativa mostra museológica visitável no andar térreo, podemos apreciar uma série de apetrechos hoje considerados obsoletos, mas que tiveram a sua época como elementos imprescindíveis à sobrevivência e desempenho do faroleiro.

À pergunta sobre a ainda necessária recorrência a estes meios, numa era em que as novas tecnologias vão dando respostas cabais a necessidades deste tipo, foi respondido que o velho método é ainda o mais fiável, e daí a sua imprescindibilidade.