Encontrava-me no hospital, de visita a um familiar, quando a
minha atenção foi acordada por um vozeirão, que alto e repetidamente clamava:
-Ó enfermeira! Ó
doutora!
E como ninguém lhe ligava, repetia:
-Ó enfermeira! Ó doutora!
A prece provinha de dois quartos adiante e saia
convictamente da boca de um doente, que por sinal, já habituara os restantes
desta peculiar forma de estar.
A curiosidade levou-me à porta do respetivo quarto e lá pude
constatar que o doente era um homem forte, calvo e com a aparência de estar
perto da casa dos setenta. Estava sentado na poltrona de napa ao lado da cama.
Já também o confrontava uma enfermeira, que mantendo uma distância estratégica,
o repreendia e elucidava:
- O senhor não pode gritar. Quando quiser alguma coisa tem
aí a campainha para chamar pelas pessoas…
Mas o homem não se sentia incomodado com a repreensão, e com
o braço esticado fletia os dedos da mão em chamamento.
-Chegue-se aqui! Chegue-se aqui! – Repetia.
-Não chego nada. Diga o que quer…Retorquia a enfermeira.
-Quero um beijo.

